Os debates do II Encontro Nacional de Educação (ENE) tiveram início na manhã desta sexta-feira (17), na Universidade de Brasília (UnB). Mais de duas mil pessoas assistiram à mesa de abertura do encontro, que teve como tema “Por um projeto classista e democrático de educação, contra o Ajuste Fiscal e a dívida pública”, e foi precedida por uma homenagem ao professor Márcio Antônio de Oliveira, ex-presidente do ANDES-SN, que faleceu na segunda-feira (13), a quem o encontro é dedicado.

A mesa teve início com a fala de José Villarroel, estudante chileno e representante do Centro de Estudantes de Sociologia da Universidade Alberto Hurtado. Ele começou sua intervenção dizendo que sua universidade, assim como muitas outras instituições privadas do Chile, está em greve há três semanas e ocupada há uma semana. Então, rememorou o processo de lutas estudantis no Chile, que vem desde 2006, com a chamada “Revoluções dos Pinguins”, e grandes ocupações de escolas.

José explicou que a ditadura de Augusto Pinochet (1973-1990) aplicou diversos ajustes do capitalismo, entre eles a privatização da educação, cujo acesso era livre à população chilena antes do golpe de estado. Com a volta da democracia, a privatização da educação se aprofundou, levando estudantes a um grande endividamento para estudar, mesmo nas poucas instituições públicas.

De acordo com José, uma carreira de ensino superior no Chile custa, tanto em universidades públicas quanto privadas, em torno de R$ 60 mil, e, com a política de crédito estudantil, chega a R$ 80 mil. “Os chilenos se formam, e trabalham até os 40, 50 anos, para poder pagar por sua educação. É por isso que os estudantes chilenos lutam há dez anos, realizando manifestações massivas todos os anos”, disse o estudante.

José Villarroel encerrou sua fala criticando o governo de Michele Bachellet, atual presidente chilena, por sua política de conciliação de classes. O estudante também citou a grande repressão à qual o estado chileno submete os estudantes que lutam por uma educação pública e gratuita, afirmando que é necessário construir a luta de forma autônoma a governos.

Ajuste fiscal
Mauro Puerro, da Secretaria Executiva Nacional (SEN) da CSP-Conlutas e representante do Comitê Nacional “Em defesa dos 10% do PIB para a educação pública,já!”,  abordou a relação da dívida pública com o ajuste fiscal. O sindicalista citou diversos cortes de orçamento em áreas sociais, realizados no governo de Dilma Rousseff e de Michel Temer, avaliando que a motivação dos cortes é aumentar a destinação de recursos públicos para a dívida pública.

O dirigente da CSP-Conlutas então explicou o Projeto de Lei Complementar (PLP) 257/2016, o qual caracterizou como um conjunto de medidas que favorecem o pagamento da dívida pública e retiram direitos dos trabalhadores, em um primeiro momento dos servidores públicos de todas as esferas e, posteriormente, de toda a classe trabalhadora, ao suspender o aumento real do salário mínimo.

Puerro citou, também, dois pontos do PLP que beneficiam diretamente os empresários em detrimento dos trabalhadores. São eles: a alteração da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) para transformar o estado brasileiro em uma espécie de segurador para investimento de empresas a nível nacional e internacional; e a transformação da sobra de caixa de banco em títulos da dívida pública, remunerando duplamente os banqueiros.

Para Mauro Puerro, as greves de servidores públicos estaduais de norte a sul do país, e as ocupações de escolas e universidades, são a demonstração do crescente repúdio da classe trabalhadora à essa lógica política e econômica. Ele encerrou sua fala conclamando os presentes à organização política para lutar contra retirada dos direitos, citando o Projeto de Emenda Constitucional (PEC) apresentado essa semana pelo governo interino, que traz um limite de gastos sociais para o orçamento da união, estados e municípios.

Educação
Olgaíses Maués, diretora do ANDES-SN e também representante do Comitê Nacional “Em defesa dos 10% do PIB para a educação pública,já!”, focou sua fala na situação da educação brasileira. A docente criticou Mendonça Filho, ministro da educação do governo interino, por ocupar a pasta sendo alheio à área, demonstrando o caráter de negociata dos cargos. Ela citou, também, diversas medidas neoconservadoras, que tem demonstrado retrocesso social, como o Projeto Escola Sem Partido, a negação do uso do nome social e a lei anti-greve.

Para Olgaíses, o ENE é espaço prioritário para dar voz às críticas à educação brasileira e construir um novo projeto, democrático e classista, de educação pública. Para ela, os últimos governos tiveram como projeto de educação a privatização, primeiro com foco no nível superior, e, agora, também aprofundando a privatização na rede básica – exemplo disso é o dado de que 74% das matrículas em ensino superior são em instituições privadas.

A priorização de recursos públicos para a educação privada, diz Olgaíses, também pode ser exemplificada por meio do Programa Universidade Para Todos (Prouni), que, só em 2015, destinou R$ 1 bilhão à educação privada por meio da isenção de impostos, e do Programa de Financiamento Estudantil (Fies) que, no mesmo ano, repassou R$ 15 bilhões à educação privada por meio de empréstimos de dinheiro público a estudantes.

Olgaíses Maués criticou também as parcerias público-privadas na educação, citando a aprovação do Marco Legal de Ciência, Tecnologia e Inovação e o crescimento da gestão da educação básica por Organizações Sociais (OS) como exemplos dessa forma de privatização velada. A diretora do ANDES-SN encerrou sua intervenção afirmando que, feita a crítica, é necessário apontar para outro caminho da educação pública no Brasil. “Educação deve ser a base da emancipação humana, deve ajuda a pensar, e não a obedecer”, concluiu a docente.

Após as três intervenções da mesa, foram abertas inscrições para debate. O ENE continua com reunião de Grupos de Trabalho (GT) na sexta à tarde, nos quais serão debatidos os eixos do encontro.

No sábado (18), pela manhã, acontecerão os painéis temáticos e, à tarde, a plenária final.

Fonte: ANDES-SN