Com uma grande homenagem a Vito Giannotti, um dos idealizadores do Núcleo Piratininga de Comunicação (NPC), falecido em julho deste ano, teve início na quarta-feira (18) o 21° Curso Anual do NPC no Rio de Janeiro (RJ).  Sob o tema “A mídia de esquerda contra o conservadorismo no Brasil”, o evento reúne até domingo (22) trabalhadores e sindicalistas de mais de 100 entidades de diferentes partes do país, representantes de diversas categorias, entre eles professores, químicos, bancários, metalúrgicos, servidores públicos e radialistas, entre outros.

O Curso do NPC é referência para sindicalistas, jornalistas, militantes sociais, professores e estudantes de comunicação de todo o país, interessados em debater a comunicação de um ponto de vista contra-hegemônico.

A programação do primeiro dia contou com a realização da mesa: “50 anos depois: ecos da ditadura nas ruas, nas escolas, no país”, com a participação de Milton Pinheiro, professor da Universidade do Estado da Bahia (Uneb) e 1º tesoureiro da Regional Nordeste III do ANDES-SN, e Sebastião Neto, diretor do Intercâmbio, Informações, Estudos e Pesquisas (IIep) e coordenador do projeto da Oposição Metalúrgica de São Paulo.

As consequências do período ditatorial no Brasil, que envolveu a articulação de bancos e indústrias com os militares, reverberam até os dias atuais no país, segundo os palestrantes. Milton Pinheiro explicou que, de fato, o fim da ditadura não significou uma ruptura total no aparato do estado, mas sim um rearranjo institucional. “A transição da ditadura brasileira para a democracia formal é a da legalidade burguesa. Foi uma articulação dos setores da classe dominante. E o que restou desta transição para os dias atuais? A estrutura do estado. O parlamento brasileiro é o mesmo que votou e elegeu naquele momento Tancredo Neves e o José Sarney. O Brasil continua autoritário. Temos uma lei que ainda protege os torturadores. Uma polícia que continua com o mesmo perfil, representando os homicídios de jovens, negros e mulheres nas periferias das grandes cidades. E a justiça que não ganhou ares de autonomia com a democracia, e continua na forma autocrática”, disse.

Sebastião Neto, um dos participantes da pesquisa da Comissão Nacional da Verdade (CNV) sobre a repressão de empresários e militares aos trabalhadores durante a ditadura no país, ressaltou a importância do trabalho realizado pela comissão, que culminou na entrega do relatório final que retratou em detalhes os crimes cometidos na época. Apesar do relatório ser uma grande conquista, a Comissão precisa continuar por conta da complexidade do tema e do surgimento de novos fatos, disse o palestrante. Ele contou que recentemente se descobriu que 1,2 mil trabalhadores rurais foram assassinados nos anos da ditadura militar.

“Os criminosos não foram punidos até hoje. Falta uma legislação que permita que essas pessoas sejam punidas. Dia 10 de dezembro completará um ano que o relatório da comissão foi entregue ao governo federal e nada foi feito. A Lei da Anistia hoje tem interpretação ambígua e impede a punição dos torturadores. Por isso iremos a Brasília (DF) nesta data exigir a mudança na lei e a continuidade da comissão da verdade”, disse.

Mesa debate política e economia

A segunda mesa do dia, “Política e economia no mundo de hoje”, contou com a participação de Eloá Cruz, advogado; Ricardo Antunes, professor de sociologia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp); e de Luiz Pinguelli Rosa, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Ricardo Antunes afirmou que atualmente vivemos a fase mais destrutiva do capitalismo, com o crescente número de adoecimentos e suicídios no mundo inteiro por conta da exploração do trabalhador.  Segundo o docente, o capitalismo se reproduz destruindo a força de trabalho por meio da sua precarização na imposição da terceirização, não apenas no Brasil. “Nós não podemos aceitar o massacre que estão fazendo. A força que nós temos hoje vem das lutas nas escolas, dos movimentos como o dos trabalhadores sem terra (MST) e sem teto (MTST), do passe livre (MPL), dos movimentos periféricos, da CSP – Conlutas, dos sindicatos de base, e temos que pensar na unicidade desse movimento”, ressaltou.

Antunes relembrou os ataques recentes promovidos pelo Congresso Nacional com a aprovação de pautas conservadoras e alertou sobre projetos que tramitam para flexibilizar as leis que regem a atividade de mineração. Para ele, o caso da barragem de Mariana, em Minas Gerais, é um grande exemplo das consequências do capitalismo.

“O que significaria para o povo brasileiro o montante financeiro de lucros líquidos acumulados desde 1997 pela Vale, mas entregue a especuladores do mercado transnacional de títulos imobiliários? Quem autorizou e como se extinguiu a obrigação legal?”, questiona Eloá dos Santos Cruz, advogado responsável por ações populares contra a privatização da Vale.  Ele contou que o decreto de criação da Vale do Rio Doce, em 1942, mandava aplicar 85% dos lucros líquidos em fundo público por onde a companhia passasse a realizar as atividades de mineração.

De acordo com o advogado, as ações feitas por ele na década de 1990 previam a criação desse fundo de reserva para atender situações como essa de Mariana. Eloá Cruz afirma que é dever do Estado proteger a população do sistema capitalista. “As ações populares, infelizmente desconhecidas dos cidadãos, são formas de combater a apatia do Estado e ferramentas necessárias na cobrança dos direitos já garantidos a população”, explica.

Luiz Pinguelli Rosa, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) acredita que apenas a construção de uma unicidade – entre movimentos sociais, partidos de esquerda, e todo o restante da população – é capaz de barrar os ataques aos trabalhadores. “É preciso ter vontade mudar e todos nós que lutamos, não apenas neste espaço, simbolizamos isso”.

O ANDES-SN e suas seções sindicais participam do Curso do NPC anualmente, com a presença de diretores e de jornalistas.

Com imagens de NPC

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Fonte: ANDES-SN