Conforme propusemos na matéria anterior sobre a instrumentalização da poesia, apresentamos agora uma bela tradução para o Latim do poema NO MEIO DO CAMINHO de Carlos de Drummond de Andrade. A tradução é do latinista Silva Bélkior. Confiram:
MEDIA IN VIA
Media in via erat lapis
erat lapis media in via
erat lapis
media in via erat lapis.
Non ero unquam immemor illius eventus
pervivi tam mihi in retinis defagatis.
Non ero unquam immemor quod media in via
erat lapis
erat lapis media in via
media in via erat lapis.
NO MEIO DO CAMINHO
No meio da caminho tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.
Nunca me esquecerei desse acontecimento
na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
no meio do caminho tinha uma pedra.
Fonte: BÉLKIOR, Silva; ANDRADE, Carlos Drummond de. Carmina Drummondiana. Rio de Janeiro/Brasília: Salamandra/UnB, 1982, p.30-31.
É claro. Questões como: Quem é o caminho? ou Quem é a pedra? Se você é pedra, se você é caminho? Ou se você só tem retinas e fatigadas. Mais: se você vai esquecer ou não de eventos inolvidáveis… Nada disso o poeta poderá responder. É por isso que ele é poeta… para não responder. Porque a verdadeira função da poesia é perguntar. Usá-la como instrumento, já é deturpação. Como o que fazemos agora.
Mas que o poema é uma jóia, lá isso é. E sua tradução é lapidar (lapis).
José Carlos de Freitas
Presidente da APUG-SSind