A redução dos direitos trabalhistas e sociais faz parte da reestruturação produtiva e do Estado brasileiro, que cada vez mais passa a ser um comitê exclusivo dos interesses das classes dominantes, inclusive com ampliação das privatizações e redução das políticas públicas fundamentais, como saúde, educação, segurança pública, infraestrutura, pesquisa e desenvolvimento tecnológico. O que contribui para a disseminação que somente o mercado é eficiente e capaz de atender os interesses da população.
Na concepção da bancada ruralista do Congresso Nacional, também conhecida como Frente Parlamentar da Agropecuária, uma das maiores e mais atuantes bancadas parlamentares, composta por mais de 200 deputados, de um total de 513, as políticas públicas de estímulo ao agronegócio tem que ampliar com mais financiamento rural e a flexibilização da legislação trabalhista. Além disso, criticam as legislações ambientais e a reforma agrária o combate ao trabalho escravo e a atuação dos movimentos sociais, notadamente do Movimento dos Terras (MST).
Para apoiar e ser apoiado pela bancada ruralista Temer cria dificuldades nas regras de combate e fiscalização ao trabalho análogo ao escravo, formulando através do Ministério do Trabalho a Portaria n° 1.129/2017, assinada pelo Ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira, reduzindo as situações que caracterizam esse crime somente onde houver restrição de liberdade, com pessoas armadas ou isolamento geográfico que impeçam o trabalhador de ir e vir.
A Portaria n° 1.129/2017 torna o trabalho escravo uma alegoria e praticamente algo inexistente se prevalecer o conceito de trabalho escravo que ela tenta impor. Por enquanto, essa portaria está suspensa em caráter liminar concedida pela ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF), ao pedido do partido Rede Sustentabilidade, que pedia a anulação dos efeitos da portaria por inconstitucionalidade. Porém, o Plenário do STF deverá se posicionar sobre a questão.
Nessa segunda década do século 21 a questão do trabalho escravo no Brasil estabelece uma colossal responsabilidade para os poderes constitucionais em todas suas esferas, que deveria estar explicitada em nossas políticas públicas, mas que, porém, vem falhando de forma sistemática, o que tem contribuído para a ampliação desse crime em todo o país, no campo e nas cidades, algo nem sempre perceptível no dado oficial, nem sempre perceptível nas metas presidenciais, nos compromissos firmados perante a Corte de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA) e perante a Organização Internacional do Trabalho (OIT) e a ONU.
Ao contrario do que vem propondo o governo do Presidente Michel Temer, trabalho escravo não é somente aquele marcado por restrições à liberdade do trabalhador, mas fundamentalmente aquele que envolve desrespeito à legislação trabalhista, degradação do trabalho, condições precárias, insalubres, prestação de serviço com sonegação de salários ou pagamentos pela prestação de serviços com valores insuficientes ao trabalhador, que frequentemente diante de suas necessidades e fragilidades sociais não conseguem se desvincular do trabalho mesmo que haja violência física, armada ou não.
Quase sempre os trabalhadores aliciados para esse tipo de trabalho são forçados a se deslocar de sua região de origem em busca de oportunidades e são aliciados com promessas de que terão emprego com carteira assinadas, com diárias bem remuneradas, com promessas de alojamentos, alimentação, transporte, ferramentas de trabalho e outras obrigações legais do contratante, mas que frequentemente os trabalhadores não sabem ou vê como “vantagens”, já que vem de lugares onde isso quase nunca é uma realidade nas relações de trabalho.
No Brasil atual, a “modernização das relações trabalhistas e a Reforma Previdenciária” é vista por grande número de empresários e políticos como uma necessidade, isso tem gerado alterações de direitos constitucionais, como foi o caso da ampliação da lei de terceirização do trabalho, a livre negociação entre patrão e empregado, onde o negociado deve prevalecer sobre o legislado e inúmeros artigos da CLT estão sendo modificados. Pior ainda, a Previdência Social é vista como uma ameaça à economia nacional, devido à manipulação da mídia inúmeras pessoas estão convictas de que existe um déficit na previdência e que a reforma é necessária a urgente.
Porém, o Governo executa uma fraude contábil nos cálculos das receitas e despesas com a Seguridade Social, pois o sistema de seguridade social é financeiramente autossustentável, sendo capaz de gerar um volumoso excedente de recursos. Entretanto, parcela significativa de suas receitas é desviada para aplicações em outras áreas pertencentes ao orçamento fiscal permitindo que as metas de superávit primário sejam cumpridas e até ultrapassadas. Então, o sistema de previdência social não está em crise e nem necessita de reformas. Não há déficit previdenciário! Não há rombo da previdência! O que existe é um superávit previdenciário mascarado para permitir uma reforma que atenda os interesses do A farsa do rombo da Previdência é semelhante à farsa de que existem abusos dos fiscais do Ministério do Trabalho no combate ao trabalho escravo e excesso de operações de fiscalização. Sendo esse argumento inclusive justificador para a diminuição dessas operações de fiscalização realizadas pelo Ministério do Trabalho, que vêm caindo desde 2013, mas foi a partir de maio de 2016, quando o vice-presidente da República Michel Temer, assumiu interinamente o cargo de Presidente que a situação se agravou ainda mais. Em 2013 ocorreram 189 operações de combate ao trabalho escravo, com 2.808 libertações de trabalhadores. Já em 2016 foram realizadas 115 operações com 885 libertações e em 2017 houve apenas 49 operações, com 73 libertações. Esse é o legado que Temer nos deixará, o Brasil da escravidão, da destruição dos direitos trabalhistas e do fim da Previdência.
Paulo Henrique Costa Mattos, Professor de História e Sociologia da Unirg e escritor. Presidente Eleito da Apug-Ssind e diretor nacional da Regional Planalto do ANDES-SN