Com a autorização, já reincidente, do Tesouro Nacional para a emissão de títulos em favor do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies), o governo federal reafirma o seu compromisso com as empresas que mercantilizam a educação no país.
Pela segunda vez consecutiva no ano, o Tesouro Nacional passa a emitir títulos em favor do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies), que opera através do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE). A autorização foi divulgada recentemente no Diário Oficial da União. Ao todo, foram emitidos títulos no valor de R$ 1,441 bilhão, que tem vencimento em 2045.
Em março desse ano, o governo federal, através do Ministério da Fazenda, já havia emitido R$ 376 milhões em Certificados Financeiros do Tesouro, em favor do Fies.
Rodrigo Ávila, coordenador da Auditoria Cidadã da Dívida, aponta que a emissão de títulos está prevista na Lei 10.260/2001, sendo o Tesouro Nacional o responsável pela emissão destes papéis, que, posteriormente, é entregue ao FIES. Esse, por sua vez, entrega-os às mantenedoras das faculdades privadas.
“O Tesouro Nacional emite estes títulos, discriminando o quanto vale cada um deles, e qual o prazo do pagamento. Na realidade, funciona como um pagamento a prazo às faculdades privadas, como ressarcimento a elas pela concessão de financiamentos aos estudantes. Tais títulos têm juros equivalentes à inflação (IGPM-FGV) e, segundo a Lei 10.260/2001, a cada trimestre o FIES deve recomprar tais títulos das faculdades privadas, que assim recebem em dinheiro. As faculdades também podem usar tais títulos para pagar tributos”, explica Ávila.
Olgaíses Maués, coordenadora do Grupo de Trabalho de Políticas Educacionais (GTPE) do ANDES-SN ressalta que essa emissão de títulos “mostra o aprofundamento da privatização da educação. O governo tem avançado, cada vez mais, nessa questão, através do aumento do repasse de verbas públicas para as empresas privadas”.
O coordenador da Auditoria Cidadã da Dívida acredita também que “o problema principal dessa operação não é a questão dos títulos, mas sim, a priorização à educação privada. Em 2014, o governo federal destinou R$ 12 bilhões para o FIES, um valor quase equivalente aos R$ 13 bilhões destinados ao custeio de todas as universidades públicas federais”.
“Hoje 70% das matrículas em nível superior são das privadas. E essa crise não vai somente cortar recursos das universidades públicas, mas mudar toda a concepção que hoje defendemos para a educação pública no Brasil”, disse Olgaíses. Em recente comunicado, o Ministro da Educação, divulgou que, no segundo semestre de 2015, o Fies abriria 61,5 mil novos contratos, somando-se às 252,5 mil vagas já abertas no primeiro semestre. Nesse ano, o total de alunos financiados é de 314 mil.
Um projeto de educação privatizante
A coordenadora do GTPE do ANDES-SN também lembra que “durante a gestão do ministro da educação, à época, Fernando Haddad, o principal plano de ação na área educacional do governo Lula foi batizado com o nome Compromisso Todos pela Educação, fazendo referência ao nome do movimento Todos Pela Educação”.
Esse movimento foi implementado, no Brasil, por grupos empresariais especialmente ligados ao setor bancário (Itaú, Santander, Unibanco, HSBC e Bradesco), à siderurgia (Gerdau) e a comunicação (Rede Globo) junto a outras organizações sociais, e tinha como objetivo a disputa por um projeto de educação dirigido e direcionado para garantir os interesses das grandes corporações econômicas que veem na educação possibilidades lucrativas e ideológicas de colocar seus preceitos empresariais como forma hegemônica de formação.
Desde então, mudanças bastante significativas passaram a ser implementadas no ensino superior, especialmente no que diz respeito ao financiamento e perspectivas de formação. “Hoje, do orçamento do Ministério da Educação, a rubrica para o FIES é a segunda, depois dos recursos para pagamento de pessoal. A verba para o FIES está à frente dos recursos para as instituições federais de ensino e para o pagamento de bolsas, por exemplo. Essa é uma demonstração clara da privatização. O maior grupo que mercantiliza a educação, Kroton & Anhanguera, tem 44% do seu orçamento advindos dos recursos do FIES”, ressalta Olgaíses.
Foonte: ANDES-SN