Pauta histórica do movimento docente, a luta contra o adoecimento docente ganhou mais elementos. Recente entrevista divulgada pela Associação dos Docentes da Universidade Federal do Pará (Adufpa-SSind) com o professor e pesquisador Jadir Campos aponta que a o produtivismo e a competividade impostos pelos órgãos oficiais de fomento e pelas políticas mercantilistas do Ministério da Educação (MEC) são responsáveis por prejuízos causados à saúde mental e física dos docentes.
Contribuindo para o aprofundamento desse debate, a Associação dos Docentes da Universidade Federal do Pará (Adufpa-SSind) divulgou em seu site uma entrevista com professor e pesquisador Jadir Campos. Ex-Coordenador de Saúde do Trabalhador da Universidade Federal do Pará (UFPA), médico, mestre na área médica e em educação e doutorando em Saúde do Trabalhador na Universidad Internacional Tres Fronteras, de Buenos Aires (Argentina), o docente da UFPA é responsável pela pesquisa “Trabalho Docente e Saúde: Tensões da Educação Superior”, resultado do seu projeto de mestrado. Nela, aparecem revelações estarrecedoras e infelizmente reais das atuais condições de trabalho dos professores, especialmente quanto ao adoecimento mental causado pelos mecanismos de controle da produção acadêmica.
No estudo, Campos discute como as tensões das políticas públicas para a Educação Superior estariam levando ao sofrimento e, consequentemente, ao adoecimento docente. São apresentados dados que sugerem que o fomento ao produtivismo e à competitividade, estimulados – sobretudo – pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), estão gerando adoecimento mental entre professores da UFPA. De acordo com a pesquisa, 14,13% dos pedidos de afastamento do trabalho de docentes da universidade, entre 2006 e 2010, estiveram relacionados a problemas com a saúde mental.
O pesquisador aponta que o cenário da sua universidade não é diferente do da maioria das instituições de ensino superior do Brasil. Para ele, “a precarização do trabalho leva a uma situação de sofrimento, e se aquela pessoa que está passando por este sofrimento não tiver condições de superá-lo, irá adoecer, pois o docente está submetido a uma série de exigências por conta da política de educação do MEC”. O adoecimento apontado é mental, mas também físico, como a Lesão por Esforço Repetitivo (LER), o Distúrbio Osteomuscular Relacionado ao Trabalho (DORT), a lombalgia e problemas de pregas vocais com alterações da voz (disfonia).
O professor da UFPA também lembra que os docentes muitas vezes não percebem a causa de seu adoecimento mental. “O docente não está percebendo que está sendo “usado” e, digamos assim, imiscuído em um contexto político em que pela falta ou pela exiguidade de recursos financeiros, os dois órgãos mais importantes de fomento à pesquisa, a Capes e o CNPq, fazem uma triagem produtivista, tornando os docentes bodes expiatórios de um esquema perverso ao professor. Deste modo, o professor vai atrás deste fomento para conseguir recursos para sua pesquisa, para ter acesso às tecnologias, bolsistas etc. O professor que consegue isto acredita que o conseguiu por ser “gênio”, porém, o que não se percebe é que isso o coloca refém do produtivismo, da competição, e impõe a exigência de um grande número de publicações em revistas com qualis elevados” afirma Campos.
Na entrevista, Jadir Campos também aponta que a Síndrome de Burnout (intimamente ligada à depressão) é a forma mais comum de adoecimento mental dos docentes causada pelo produtivismo acadêmico, e já é a segunda doença que mais afasta trabalhadores de suas atividades no mundo, após a LER-DORT. “A Síndrome de Burnout tem características especiais. A exaustão emocional; a falta de envolvimento com o trabalho, a pessoa perde o interesse e já não tem mais o mesmo entusiasmo de antes; e a desumanização. A desumanização se expressa naquele professor que é questionado pelo aluno e responde com pedras na mão e não deixa ninguém sequer intervir, adotando posturas autoritárias com falas como ‘Aqui o professor sou eu, fique calado’, ou adota posturas similares quando abordado pelas demais pessoas”, alega Campos.
A solução desses problemas, segundo o entrevistado, passa pelo combate às atuais formas de controle da produção acadêmica. “Não se iludam, todas essas políticas criadas pelo MEC tem um viés de controle. Por exemplo, quando se impõe uma avaliação quantitativa aos docentes, com uma série de requisitos e pontuações que devem ser preenchidas, isso faz parte de uma política de controle. A Lei de Inovação Tecnológica é outra questão perigosíssima, pois ela incentiva o professor a ser além de produtivista, empreendedor. Essa Lei direciona a pesquisa aos interesses mercantis, sujeitando os docentes a pesquisarem de acordo com o retorno que os resultados da pesquisa darão ao mercado, às empresas e/ou indústria; além disso, outras áreas que não estão ligadas aos interesses industriais e de mercado, são penalizadas, dificilmente tem seus projetos aprovados porque não são “rentáveis”. Aquilo que existia nas universidades em termos da autonomia, não existe mais. Tornou-se o que nós chamamos de ‘autonomia consentida’. Você vai até onde a instituição acha que é permitido ir. O próprio docente está comprometido em sua autonomia intelectual, ou seja, ele não tem mais a liberdade de pesquisar o que ele julga e percebe ser importante para a sociedade e para a universidade”, concluiu Jadir Campos.
- Com informações e foto de Adufpa-SSind