Os participantes do 3º Encontro deste primeiro semestre de 2021, do Curso de Extensão em Filosofia, Literatura e Cinema, promovido pela Apug em parceria com os cursos de Direito, Psicologia, Educação Física, Letras e Pedagogia da Universidade Unirg, debateram o tema Trabalho Escravo na Região Norte do Brasil, tendo como referência o filme Pureza, produzido em 2019 e dirigido por Renato Barbieri.
Ainda que não tenha sido lançado oficialmente, o filme suscita uma realidade latente vivida nas áreas rurais dominadas pelos latifundiários, desnudando a realidade do campo brasileiro, denunciando as atrocidades cometidas sem que a maioria da população brasileira saiba do verdadeiro massacre e regime escravagista vivenciado em nossa contemporaneidade, muitas vezes com a conivência dos políticos, que dominam as regiões agrárias dos rincões brasileiros e usam a atuação política para camuflar os reais interesses, aumentando ainda mais a violência e o das violações dos trabalhadores rurais, embora tenhamos também a escravidão contemporânea nas grandes metrópoles brasileiras.
De acordo com a sinopse do filme, o “Longa-metragem inspirado na história de Pureza Loyola, uma mãe que, após seis meses sem notícias do seu filho Abel, sai de Bacabal (Maranhão) para procurá-lo, com a roupa do corpo e poucas economias dentro da bolsa. Abel havia partido para o garimpo no sul do Pará. Ela refaz o caminho do filho e acaba encontrando um sistema de aliciamento e de cárcere de trabalhadores rurais, que os coloca em uma situação de escravidão. Pureza, esperando encontrar Abel, se emprega numa das fazendas, onde testemunha o tratamento brutal de trabalhadores e o desmatamento florestal. Escapa e denuncia os fatos às autoridades federais. Sem credibilidade e lutando contra um sistema perverso, ela retorna à floresta para coletar provas do que relatou em Brasília. Depois de anos, encontra seu filho e suas denúncias desencadeiam um processo de mobilização do Estado brasileiro que liberta milhares de trabalhadores da situação da ‘escravidão moderna’ ou ‘escravidão por endividamento’.”
Carregado de realidade e de muita emoção, consegue sensibilizar até mesmo quem já o assistiu. Embora não tenha ganhado ainda as telonas comerciais, Pureza já venceu 25 premiações em 2020, sendo o filme brasileiro mais premiado do ano passado. Segundo Renato Barbieri, o lançamento oficial ficou travado por conta da pandemia, mas que está sendo trabalhado com muito carinho, e deverá causar grande impacto social e fortalecer a luta contra a desigualdade rural e porque não urbana no país.
Convidados
Este terceiro encontro foi coordenado pelo professor Paulo Henrique Costa Mattos (Unirg), Gilberto Correia da Silva, presidente da Apug e prof. Joel Moisés Silva Pinho, tendo como convidados o historiador Edmundo Rodrigues Costa, também atuante como agente pastoral na Comissão Pastoral da Terra Araguaia-Tocantins; prof. Diego Macedo, doutor em Ciências Agrárias, docente na Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará, e um dos figurantes do filme Pureza; Xavier Plassat, frei dominicano, também agente da Comissão Pastoral da Terra Araguaia-Tocantins, cientista politico formado na França e como gosta de se apresentar: “formado em revolução estudantil e mobilização popular pela Universidade das Ruas de Paris, em maio e junho de 1968”.
Para o professor Paulo Henrique Costa Mattos, a escravidão de homens e mulheres em pleno século XXI ainda é uma triste herança do século XIX, que atravessou o século XX, sob fortes tentativas de invisibilidade e negacionismo. “Porém, Renato Barbieri nos ajuda com sua Pureza, a compreender que os mais humildes e mais pobres de nossa sociedade têm muito a nos ensinar. Pureza com sua coragem, sua luta e vontade de viver livre ajudou a construir uma abnegada luta contra a escravidão contemporânea, algo que nem mesmo os governos mais conservadores e neoliberais puderam apagar. Se hoje a resiliência, a empatia e alteridade são fundamentais para manter o combate a super exploração do trabalho, a escravidão e ao tratamento desumano, cruel e degradante, essa chama foi acessa e mantida com a força de uma mulher, proletária e combatente, resistente e que não se dobrou perante a força do dinheiro, da força do agronegócio e das mais brutais violações dos diretos humanos”, alerta.
Mattos reforça ainda que “Barbieri nos ilumina o caminho da resistência e aponta o caminho do combate e da luta contra os news escravistas do século XXI. A pureza de sua causa pode ser vista na Pureza de sua heroína popular, demonstrando que no Brasil não precisamos de falsos mitos e antigos capitães do mato para nos dizer o que devemos fazer perante o injusto, o cruel e as violações dos direitos humanos mais básicos. Por isso, precisamos todos conhecer Pureza!”, finaliza.
O agente pastoral e historiador Edmundo Rodrigues Costa enfatiza que o filme Pureza é uma obra de arte que retrata a triste realidade do Trabalho Escravo Contemporâneo. “Como é bonito ver no filme, a Pureza ter a sensibilidade de Mãe e ir atrás do seu filho que saiu em busca de uma vida melhor. Ao chegar no estado do Pará na cidade de Marabá, Pureza começa a perceber a armadilha em que o filho caiu. Resolveu trabalhar como cozinheira e nesse desafio foi descobrindo todas as armadilhas do trabalho escravo. Com sua sensatez e amor de Mãe, ajudou a cuidar dos trabalhadores e denunciou as autoridades toda a situação, Pureza foi de uma coragem tremenda. Pureza ajudou na sua luta a tornar os Trabalhadores libertos”, finaliza Costa.
O professor e figurante do filme, Diego Macedo, que mesmo tendo participado do filme e assistido várias vezes, afirmou que foi extremamente positiva a oportunidade de ver mais uma vez o filme Pureza e ainda se emocionar como da primeira vez, pela experiência e pela rica experiência de debater com os convidados no evento promovido pela Apug e Unirg. “Foi uma grande satisfação poder compartilhar experiências e aprender com os amigos professores de Gurupi e também da Comissão Pastoral da Terra, especialmente em uma atividade de extensão tão longeva e com um tema tal impactante como o trabalho escravo. Momento de reflexão e debate como estes são extremamente necessários, em especial no momento atual. É fundamental estarmos atentos e firmes na luta, contra toda forma de opressão e, consequentemente, pela consolidação dos direitos, à terra, à emancipação, à humanização”, afirmou o professor da Unifesspa.
O professor Joel Pinho, da equipe de coordenadores do curso resumiu a importância do filme: “Um filme que retrata e desvela o macabro mundo das relações trabalhistas no campo. Prestando um serviço a sociedade ao denunciar estas atrocidades.”
O professor José Carlos Freitas, idealizador do Curso de Extensão em Filosofia, Literatura e Cinema, existente há quase 12 anos, resolveu externar sua opinião em forma de poesia:
PUREZA
Uma mãe que busque seu filho
no inferno da crueldade do mundo
não pode ser mãe de um filho só.
Ela não sabe ser mãe de um filho só.
Mãe assim estende seu dolorido amor
a todos os que foram jogados à orfandade.
Amor de mãe assim milita
em nome de todas as mães impotentes
com seus filhos perdidos e exterminados.
Uma mãe assim só pode se chamar Pureza.
Pureza… Pureza… Pureza… Pureza!
Compaixão, luta e fé
realizando a necessária denúncia
da cara vergonhosa da ambição humana.
25.04.2021
(Poema para celebrar, com gratidão, a vida exemplar de uma mãe retratada no filme PUREZA, de Renato Barbieri, Brasil, 2019.)
A próxima edição do Filosofia, Literatura e Cinema acontece no dia 15 de maio e vai continuar abordando o trabalho escravo na região norte.
Fonte: Ascom/Apug-Ssind