AS LIÇÕES QUE AS RUAS JÁ NOS ENSINARAM!!

 

          Tenho 46 anos e durante muitos anos fui militante político partidário, desistindo de tal prática depois de ver a corrupção, o carreirismo político, os programas políticos históricos serem jogados na lata de lixo e o mal uso dos cargos públicos virar realidades quase inexoráveis.

          Nos meus anos de militância político partidária participei de inúmeras lutas sociais em prol da melhoria das políticas públicas, pelo fim do autoritarismo e da ditadura, pelo fim da corrupção e pela ética na política. Foi assim que participei da luta das Diretas Já, do Fora Sarney, Impeachment do Collor, pela Reforma Agrária Já, pela Não Privatização do Patrimônio Público e por inúmeras lutas em Defesa da Educação e Saúde Gratuita e de Qualidade.

          Por isso mesmo tenho acompanhado com entusiasmo as manifestações da juventude do Brasil, dos milhares de brasileiros das cidades e do campo, dos negros e negras das periferias, das mulheres marginalizadas, dos homossexuais discriminados, dos usuários revoltados com falta de qualidade das políticas públicas de saúde, educação, transporte público e tantas outras marcadas pela corrupção e má gestão.

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          O que está acontecendo no país é um grito de revolta de uma ampla parcela da sociedade brasileira que já não suporta mais a crise urbana instalada nas cidades brasileiras, provocada por uma etapa do capitalismo financeiro que gera uma forma burguesa de fazer política altamente nociva e uma condução da economia do país, com tanto descaso com os problemas básicos do povo, tanto desvio do dinheiro público, tanta impunidade, tanto privilégio dos políticos e manipulações dos partidos no poder ou fora dele.

          Os 20 anos de predomínio do neoliberalismo na economia e a na política brasileira transformaram o país em refém dos interesses do capital, fizeram os maiores partidos de esquerda a renunciarem a construção de governos populares, a lutarem pela revolução socialista, a respeitarem seus programas históricos. No geral os partidos envelheceram em suas práticas e se transformaram em meras siglas de aluguéis, aglutinando todo tipo de oportunistas, bandidos de colarinho branco e ladrões do dinheiro público.

          A grande maioria da população, principalmente os mais jovens, que estão nas ruas hoje não teve oportunidade de participar da política institucional ou ideológica do país. Nas últimas décadas só viram os capitalistas pagarem e depois os políticos os obedecerem, só viram triunfar a mentira, a enganação, a manipulação, a corrupção e o mal uso da coisa pública. A sociedade brasileira viu nas últimas décadas todas as siglas partidárias, em maior ou menor número, se moldaram a esses métodos, demonstrando um envelhecimento, burocratização e falta de respostas aos clamores do povo. E, portanto, gerou principalmente na juventude uma ojeriza às siglas partidárias, à forma dos partidos atuarem e a maneira dos políticos agirem.

          Embora a indignação seja geral e atinja inúmeros setores da sociedade, quem efetivamente está nas ruas ainda não é a classe trabalhadora. Quem está na rua são os filhos da classe média, da classe media baixa, e também o subproletariado, que estuda e trabalham no setor de serviços, que melhoraram um pouco as condições de consumo, mas que ainda não haviam sidos ouvidos pelos governos. Assim podemos dizer o grande mérito das atuais manifestações em inúmeras cidades do país foi a redução das tarifas de ônibus, que interessava muito a todo o povo, mas a classe trabalhadora em sua maioria ainda não entrou nos movimentos, não se move afetando diretamente o grande capital. Isso ainda não começou acontecer, embora não esteja descartado.

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          É por isso que já está em curso no país uma forte tentativa de impedir que as atuais manifestações alcance a classe trabalhadora e que essa passe também a lutar por seus direitos, realizando greves e manifestações por melhorias salariais, desfraldando bandeiras que possam motivar a classe a se mexer e a também dizer um basta ao modelo econômico, ao retorno da inflação, ao arrocho salarial, a corrupção, a falta de uma democracia consistente e ao predomínio total do mercado em todos os setores.

          É por isso que já vemos as minoritárias insignificantes diante das milhares de pessoas que se mobilizam ganharem tanta visibilidade, é por isso que alguns políticos falam tanto dos “baderneiros”, dos “arruaceiros” nas manifestações pelo país. Essa é a tática de assustar o povo colocando apenas a propaganda dos quebra-quebra, a ação dos irresponsáveis que depredam o patrimônio público em maior evidencia. O que está por trás disso é o interesse de colocar no imaginário da população que no fundo toda manifestação só termina em bagunça e caos. De que a culpa é toda do governo e que é preciso exigir a presença das Forças Armadas para defender os estádios e o patrimônio público.

          Já existem denúncias que hoje nas principais capitais do país existem grupos organizados com orientação de fazer provocações e saques, agressões e badernas. Já existem denúncias que traficantes, assaltantes, grupos fascistas e leões de chácaras agiram em diversas manifestações pelo país. Uma das denúncias afirmam que no Rio de Janeiro, palco das maiores manifestações do país, atuaram as milícias organizadas que protegem políticos conservadores. Mas também é preciso perceber que nessas manifestações há também um lumpesinato desorganizado que sempre aparece em qualquer mobilização popular, tentando tirar proveito e praticando atos de vandalismo e agressões puras. São rebeldes sem causa, frustrados sociais altamente benéficos aos que pretendem manipular os atos públicos.

          Nesse sentido, é preciso que os lutadores de hoje saibam no entanto que o discurso da “baderna e do vandalismo” é falso, assim como o discurso do “fim dos partidos políticos como solução”… Esse discurso é tão autoritário e conservador como aquele que afirma que “todo político é ladrão” e que o “único problema do Brasil é a corrupção”. É verdade que os partidos precisam mudar, os políticos corruptos precisam ser presos e as instituições públicas precisam avançar, mas não faremos isso sem partidos, sem política, sem ideologia e sem trabalhadores nas ruas. O passado fascista, as ditaduras na América Latina nos ensinaram isso!!

Paulo Henrique Costa Mattos, é professor de História e Sociologia da Unirg em Gurupi,

phcmattos@ibest.com.br

Rua Balcares 398, Qd-12, Lote S-12, Jardim Sevilha, Gurupi, Tocantins